17.10.09

Hélia Correia (Portugal)

     
    
    


Xilogravura de Ernesto Bonato
Série-Deambulatórios-2007
     
    
    



Ouço o incêndio, as fábricas. O berço
do suor interrupto. Ouço às vezes quem se ama
onde o amor não há – apenas morre
no clandestino abrir.
Ouço às vezes quem rompe os mapas cerce
e então na noite recupera as loucas
emigrações da história. Ouço crescendo
secamente os filhos no rancor e na linfa.
Astuciosamente recolhendo as vastidões adversas.
Ouço em momentos fartos o entulho,
desdobrada a raiz, fundar o mês da heresia,
a sábia recriação do sumo.
Ouço o arado. A luz. Profundamente
os barcos segregados na propensão do mar.
Ainda quem a medo desagregue
a centenária paz:
- os homens,
onde os ouço, aqui recordo
as origens compradas do terror.
Os homens, onde os ouço, aqui confirmo
suas mãos.
     
       
   

8 comentários:

José da Silva Martins disse...

Informação do Grupo Porto Editora.

Escritora portuguesa contemporânea (1949), licenciou-se em Filologia Românica e é professora de Português do Ensino Secundário. Apesar do seu gosto pela poesia, é como ficcionista que é reconhecida como uma das revelações da novelística portuguesa da geração de 1980, embora os seus contos, novelas ou romances estejam sempre impregnados do discurso poético.
Estreou-se na poesia com O Separar das Águas, em 1981, e O Número dos Vivos, em 1982.
A novela Montedemo, encenada pelo grupo O Bando, dá à autora uma certa notoriedade. Aliás, Hélia Correia revelou, desde cedo, o gosto pelo teatro e pela Grécia clássica, o que a levou a representar em Édipo Rei e a escrever Perdição, levadas à cena, em 1993, pela Comuna. Escreveu também Florbela, em 1991, que viria a ser encenada pelo grupo Maizum.
Destacam-se ainda na sua produção os romances Casa Eterna e Soma e, na poesia, A Pequena Morte/Esse Eterno Conto.
Recebeu em 2002 o prémio PEN 2001, atribuído a obras de ficção, pela sua obra Lillias Fraser.

Isabel disse...

e um doce e pessoa....com olhos generosos e inteligência acutilante.

um nome a sério na cultura a sério....:)


bom dia JSM.

Isabel disse...

gaita....lá volto eu a "invisibilizar" letras:


"UM DOCE DE...."

ainda tenho um ataque de fúria...:)

maré disse...

a terra
sujeita às emigrações que confirmam o rumor das mãos
agora que
des dobradas raízes
irrompem os mapas da heresia
barcos segregados do caminho dos homens.

_______

um beijo JSM
outro para quem chega e vai trazendo o barulho das ondas

maria josé quintela disse...

ouvir assim com as mãos é possuir um outro sentido.



obrigda JSM.

Eme disse...

Do suor e das mãos no feno de antigamente. Tem cheiros e sabores de Verão. Uma história inteira em poema.

Sempre a ensinar JSM. Desconhecia.

Abraço

José Pires F. disse...

Gostei.
Mais um nome a ter em conta.

Abraço.

Paula Viotti disse...

Amigo JSM

A Hélia Correia que nos mostra despertou em mim uma curiosidade compulsiva.

Depois dos comentários da Poeta IMF corri até à LER DEVAGAR e lá encontrei vários exemplares da sua obra.

Comprei para o meu filho o MOPSOS, o pequeno grego, com ilustração de Henrique Cayatte.

Por isso agradeço-lhe o despertar.


Aproveito para lhe deixar um abraço
e violetas cristalizadas.

P