3.10.09

David Mourão Ferreira (Portugal)

     
    
     


foto Paulo V.
     
     
     


Tentei fugir da mancha mais escura


Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão...

Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que me sai, sem voz, do coração.
    
    

5 comentários:

maria josé quintela disse...

só mesmo um grande Poeta é capaz de iluminar assim uma mancha lunar.



obrigada pela ressuscitação neste lugar de culto.



um abraço.

Isabel disse...

enorme poema de amor que se entrega e desiste ____________e resiste porém na margem do sentimento mayor.


profundo o lirismo quase "gráfico" muito bem sustentado pela ft de P.V.
:)


afinal nunca se foge à mancha da morte.


sendo um exorcismo de amor é tb o reconhecimento de todas as sombras que desnudam o corpo final.


.


abraço.

José Pires F. disse...

David Mourão Ferreira era grande Poeta, muito grande.

Nada acrescento ao que diz a I, se alguém conhecia o homem e conhece o Poeta, é ela.

Deixo um poema de que muito gosto.

PARAÍSO

Deixa ficar comigo a madrugada,
para que a luz do Sol me não constranja.
Numa taça de sombra estilhaçada,
deita sumo de lua e de laranja.

Arranja uma pianola, um disco, um posto,
onde eu ouça o estertor de uma gaivota...
Crepite, em derredor, o mar de Agosto...
E o outro cheiro, o teu, à minha volta!

Depois, podes partir. Só te aconselho
que acendas, para tudo ser perfeito,
à cabeceira a luz do teu joelho,
entre os lençóis o lume do teu peito...

Podes partir. De nada mais preciso
para a minha ilusão do Paraíso.

David Mourão Ferreira

maré disse...

queria renegar o teu corpo
a tua luz
o terreno onde a noite se pronunciava ao meu abrigo
desenhei punhais à minha insensatez

ferveu o sangue na loucura silábica que te pronunciava
e reparei que o poema florescia
só quando a noite rebentava em fendas de luz que o teu corpo me deixava.

______

Também gostei muito

deixo um braçado de flores e beijos a todos, que o domingo está cinzento e precisa de sorrisos

Maresias disse...

A Poeta IMF já disse tudo,

"enorme poema de amor que se entrega e desiste ____________e resiste porém na margem do sentimento mayor."

O amigo PiresF acrescentou o PARAÍSO.

Lauro António disse em 1986

"Em poesia, creio que é o nosso maior autor contemporâneo a cantar o amor e o desejo. (...)

in A Capital, 29.12.86



Só me resta desejar a todos os presentes

e aos vindouros,

que o amor seja sempre feliz.

Abraço-vos